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A leishmaniose está entre as seis mais importantes endemias do mundo

Editoria: Vininha F. Carvalho 24/11/2006

A leishmaniose é uma enfermidade causada por microorganismos protozoários do gênero Leishmania, provocando infecções em seres humanos e animais, principalmente nos países tropicais e subtropicais com climas quentes e úmidos.Dependendo da espécie envolvida, as leishmanias fazem parte de dois grandes grupos: o grupo que causa a leishmaniose tegumentar (leishmaniose cutânea, muco-cutânea e cutânea difusa), sendo que nesse grupo encontramos a Leishmania mexicana, L. braziliensis, L. tropica.

O segundo grupo, este de maior interesse, é o da leishmaniose visceral e os protozoários envolvidos são a Leishmania donovani e L. chagasi, sendo apenas esta última encontrada no Brasil.

A prevalência mundial das leishmanioses em humanos é muito alta, sendo que ocorrem de 100.000 a 500.000 casos de leishmaniose visceral anualmente, 90% dos quais são descritos na Índia, Sudão e Brasil.

Esta doença está presente nas Américas, Europa, Oriente Médio, África e Ásia, fazendo com que a leishmaniose seja colocada entre as seis mais importantes endemias do mundo (endemia é a doença que aparece constantemente em determinada região, acometendo número maior ou menor de indivíduos).

No Brasil, a doença ocorre atualmente nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste e vem apresentando franca expansão pelo país. O primeiro relato da ocorrência de leishmaniose visceral canina no estado de São Paulo ocorreu na cidade de Araçatuba, em 1998.

Em 2000, foram registrados mais de 3700 casos de leishmaniose humana em 18 estados brasileiros. Estima-se que para cada caso humano, há pelo menos uma média de 200 cães infectados. As infecções dos cães precedem sempre a aparição dos casos humanos, pois o cão é considerado o reservatório principal da doença para o ser humano.

Ambas leishmanioses (tegumentar e visceral) são adquiridas principalmente através da picada de insetos (mosquitos), os quais atuam como vetores biológicos. Entretanto, excepcionalmente não fazendo parte da epidemiologia da doença, picadas de moscas (a Stomoxys calcitrans, uma mosca sugadora de sangue bastante comum) e de carrapatos, ambos podem transmitir a leishmaniose e atuarem acidentalmente como vetores mecânicos.

Ainda podemos ter a transmissão da leishmaniose de forma acidental através do contato direto entre o material infectado (úlceras ou secreções de animais doentes) e membranas mucosas ou pele lesionada ou através de transfusões sangüíneas.

Os mosquitos flebotomídeos são os vetores biológicos mais comuns na transmissão das leishmanioses, dentre eles o Lutzomyia longipalpis. São mosquitos bastante comuns que vivem em locais ricos em matéria orgânica e baixa luminosidade, tais como galinheiros, chiqueiros e também nas residências.

Ambos os sexos dos flebotomídeos necessitam de carboidratos que sugam das plantas, mas apenas as fêmeas necessitam do sangue para desenvolvimento dos ovos. A atividade máxima deste mosquito inicia-se aproximadamente ao entardecer indo até por volta das 23hs. No interior das residências o L. longipalpis é encontrado em repouso principalmente nas paredes dos dormitórios, até o amanhecer. Fora das residências sua atividade ocorre nos abrigos de animais domésticos, incluindo os canis.

Apesar da leishmaniose tegumentar também ser uma enfermidade que necessita de atenção e cuidados veterinários, pois provoca profundas lesões em cães e gatos, com nódulos pruriginosos com tendência a ulcerar, é a leishmaniose visceral a mais importante por ser uma zoonose, ou seja, doença que animais podem transmitir ao homem.

Os hospedeiros vertebrados podem ser os animais silvestres: roedores, gambás, tamanduás, tatus, canídeos, primatas e preguiças. Podem também funcionar como hospedeiros os animais domésticos tais como: cães, gatos e eqüinos. Entretanto, são os cães, que fora do ambiente silvestre, apresentam grande importância na manutenção do ciclo da doença, gerando muitas dificuldades no seu controle.

A prevalência da leishmaniose canina é maior que a humana e normalmente em locais endêmicos, os casos de leishmaniose humana são precedidos por casos caninos, devido aos cães apresentarem um maior número de parasitas de pele.

O ambiente propício do aparecimento da leishmaniose é aquele de baixo poder sócio-econômico, freqüentemente pobreza associada com promiscuidade, comum principalmente no meio rural e na periferia das grandes cidades.

Dados epidemiológicos mais recentes, entretanto, têm revelado uma crescente urbanização da doença. Populações que passam por dificuldades sócio-econômicas e que não apresentem condições higiênico-sanitárias adequadas propiciam a reprodução do vetor (mosquito), permitindo assim a disseminação do agente etiológico (Leishmania sp).

Segundo a Fundação Nacional de Saúde, anteriormente a leishmaniose visceral humana no Brasil era mais comum em crianças até 9 anos de idade, sendo que 60% dos casos eram registrados em crianças até 4 anos. Isso porque as crianças mal nutridas apresentavam-se imunossuprimidas (redução ou extinção da resposta imunológica) que ainda vivendo em regiões endêmicas, apresentavam uma maior susceptibilidade à doença.

Atualmente, entretanto, constatou-se que tem aumentado o número de pessoas com mais de 15 anos de idade que contraem a leishmaniose. Na Europa, por exemplo, verificou-se que pessoas imunossuprimidas pela AIDS, apresentam a leishmaniose visceral como importante doença oportunista, levando até a revisões das medidas de controle que vem sendo adotadas.

No homem o período de incubação da doença após a picada do mosquito varia de 2 a 6 meses. A doença poderá ficar oculta até ocorrer uma imunossupressão, a qual provocará uma multiplicação do parasita.

Os sintomas comumente observados nos humanos são: febre prolongada e irregular, emagrecimento, anemia, aumento de volume abdominal principalmente nas crianças, diarréia, vômitos, hemorragias e tosse. Em pacientes humanos não tratados a mortalidade costuma ser alta.

Assim como no homem, as manifestações clínicas da leishmaniose visceral canina, também denominada Calazar Canino, apresentam sinais inespecíficos tais como: linfoadenomegalia, alterações dermatológicas como descamação da epiderme, pelagem seca, regiões do corpo sem pêlos, úlceras cutâneas, principalmente na face, no focinho, orelhas e região interdigital, hiporexia ou perda ou redução do apetite, onicogrifose ou crescimento exagerado e encurvado das unhas, perda progressiva de peso, mucosas pálidas, alterações oculares, hipertermia, com febres irregulares, etc.

Em cães, a imunossupressão pode promover a ocorrência de várias infecções oportunistas tais como demodicoses, escabiose, malassezíase, dermatofitose, piodermites, cistites, pneumonias bacterianas, erliquiose, babesiose, dirofilariose. A leishmaniose também já foi descrita associada a algumas neoplasias como o linfossarcoma de Sticker, mieloma, leucemia linfóide, etc.

Não foi evidenciado até o momento predisposição sexual, racial ou etária relacionada com a infecção, no entanto, acredita-se que as raças de cães miniaturas sejam menos afetadas, provavelmente por viverem mais no interior das casas e ficarem assim mais protegidos dos mosquitos.

Em cães susceptíveis, após a infecção da pele, ocorre imediata disseminação do parasita, com posterior desenvolvimento dos sintomas. Ou seja, dependendo da imunocompetência do hospedeiro (capacidade da resposta imunológica do cão), os sinais clínicos tornam-se evidentes dentro de um período que varia de alguns meses até vários anos.

A infecção por Leishmania sp usualmente causa uma doença sistêmica crônica, no entanto, a evolução pode ser aguda e grave, nestes casos levando o animal a óbito em poucas semanas. Por outro lado, em alguns cães o desenvolvimento da doença pode ser latente, inclusive evoluindo para a cura espontânea.

A agravante é que a forma assintomática da doença pode representar de 20 a 40% de uma população soro-positiva, ou seja, o animal está doente, mas não apresenta sintomas.

O diagnóstico da leishmaniose visceral muitas vezes é um problema para o clínico veterinário por ser uma enfermidade que tem sintomas comuns com outras doenças e por não haver um teste diagnóstico 100% preciso e específico, pois todos métodos de diagnósticos têm suas limitações.

O diagnóstico mais seguro é aquele em que se encontra o parasita em esfregaços sangüíneos. Sabe-se, entretanto, que animais com severa manifestação clínica têm uma maior probabilidade de encontrar o parasita, enquanto que animais infectados, porém assintomáticos, o achado do parasita é pouco freqüente.

Além do esfregaço sangüíneo, outro meio de diagnóstico é a realização de provas sorológicas, ou teste de ELISA. Estas provas geralmente apresentam alta sensibilidade e especificidade, entretanto elas podem apresentar resultados falso-positivos e falso-negativos.

A leishmaniose é mais resistente à terapia em cães do que em humanos e, freqüentemente apesar de ser possível a cura clínica através de tratamento, raramente se consegue eliminar completamente o parasita e as recidivas são comuns (a doença reaparece algum tempo depois da convalescença).

A situação se complica porque muitas vezes com a instituição de um tratamento empírico, podem ser selecionadas cepas de leishmanias resistentes, e isso futuramente pode provocar um grande impacto no tratamento humano, pois as drogas adotadas e consideradas eficientes atualmente são poucas e com muitos efeitos colaterais.

As principais estratégias de controle da leishmaniose visceral no Brasil preconizadas pela Fundação Nacional de Saúde consistem nas seguintes medidas: controle e eliminação dos vetores (mosquitos, moscas, carrapatos) através do uso de parasiticidas, eliminação do maior reservatório, que é o cão doméstico soro-positivo e o tratamento e redução de riscos em humanos.

A eliminação do cão soro-positivo é um assunto bastante controverso, pois embora seja uma medida recomendada pelo Ministério da Saúde, sabe-se por alguns estudos que a eliminação de cães soro-positivos em algumas regiões não diminuiu a taxa de infecção em humanos. Isso sugere que sem o controle do principal vetor não adianta eliminar o cão soro-positivo para impedir a disseminação da infecção.

Existe atualmente no mercado uma nova arma contra a Leishmaniose desenvolvida pelo Laboratório Intervet Pet, a Coleira Scalibor, a base de um potente inseticida, a deltametrina, da família dos piretróides. Esta coleira protege os cães contra as picadas dos mosquitos evitando assim a sua contaminação pela leishmaniose, pois elimina o inseto do meio ambiente.

A deltametrina é liberada continuamente na camada lipídica da pele do cão protegendo-o por até 4 meses contra os mosquitos da família Phlebotomidae.

A deltametrina não tem cheiro e apresenta alta segurança para o cão e para as pessoas que com ele convive. Além disso, a Coleira Scalibor tem indicação no auxílio da prevenção de infestações causadas pelo carrapato Rhipicephalus sanguineus, no auxílio da parevenção da pulga Ctenodephalides felis e também auxilia o controle das moscas Stomoxys calcitrans e Musca domestica.

Cabe ao clínico veterinário evitar que esta importante zoonose se dissemine, orientando e educando a população, garantindo assim a compreensão e o envolvimento da comunidade no sentido de se produzir ações de vigilância e controle da leishmaniose nos seus vários aspectos.




Fonte: Dr. Gerson Bertoni Giuntini - Biólogo, Engenheiro Agrônomo e Veterinário

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